DO BARRO AO VERBO
UMA TRAVESSIA NORDESTINA DE PENSAMENTOS
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Textos

QUANDO O CEU CANSA, O INFERNO PUXA

 

“Se o céu é o limite, o inferno é um poço sem fundo.” Essa frase carrega uma tensão existencial profunda, pois contrapõe dois horizontes simbólicos que nos habitam: o céu, como metáfora da transcendência, da possibilidade, da esperança e do vir-a-ser; e o inferno, como representação do abismo interno, da repetição, da queda contínua sem freio nem fim.

 

Filosoficamente, podemos entendê-la como uma crítica à crença moderna no progresso infinito, no ideal de superação ilimitada do humano — o “céu” como destino sempre além, como promessa inatingível. No entanto, essa busca desenfreada pelo alto, pelo sucesso, pela elevação constante, arrisca deixar na sombra aquilo que recusamos encarar: o fundo de nós mesmos. E o que não é integrado, nos arrasta.

 

Enquanto o céu possui um “limite” — um lugar onde se chega ou ao menos se mira — o inferno, por outro lado, não oferece repouso. É um “poço sem fundo”, ou seja, uma queda perpétua. Aqui, encontramos ecos de Heidegger, quando fala do “esquecimento do ser”: ao perdermos o contato com nosso ser mais próprio, mergulhamos na superficialidade e na alienação — queda sem fim. Há também uma ressonância com o niilismo de Nietzsche, para quem o vazio deixado pela morte de Deus pode nos precipitar num sentido em colapso.

 

Assim, essa frase não apenas opõe alto e baixo, mas convida à reflexão sobre os extremos da condição humana: a ânsia de ascensão que pode se tornar delírio, e a angústia da queda que se torna prisão. Entre o céu e o inferno, o ser humano está suspenso, jogado, convocado à responsabilidade de dar sentido ao abismo — sem negar nem o limite, nem a profundidade.

 

Talvez a sabedoria esteja em não fazer do céu uma fuga e do inferno um destino, mas reconhecer em ambos metáforas da travessia existencial que nos constitui.

 

Jeovan Rangel
Enviado por Jeovan Rangel em 04/08/2025
Alterado em 04/08/2025