DO BARRO AO VERBO
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Textos

DESEJO CONTÍNUO 

 

“24 E chamou o seu nome José, dizendo: O Senhor me acrescente outro filho”. (Gn 30:24)

 

A partir do significado do nome José (Yoséf – יוֹסֵף) e da frase pronunciada por Raquel ao dar-lhe o nome — “Que o Senhor me acrescente outro filho” (em hebraico: “Yoséf Adonai li ben acher”) — podemos explorar um texto filosófico-psicológico com enfoque ideológico sobre desejo, incompletude, transcendência e persistência da alma humana diante da graça

 

Yoséf: O Desejo que Persiste Mesmo Após a Dádiva

 

Na antiga língua hebraica, as palavras não são apenas sons que nomeiam, mas pontes entre o homem e o sagrado. O nome Yoséf (יוֹסֵף), traduzido como “acrescentará”, nasce de um gesto paradoxal: o da gratidão que se transforma imediatamente em súplica. Raquel, ao dar à luz José, não se encerra na alegria do milagre recebido — ela clama por mais. Ela nomeia não o que tem, mas o que ainda espera.

 

Este gesto diz muito sobre a alma humana.

 

Raquel representa o arquétipo do sujeito que, mesmo após alcançar algo profundo — a maternidade desejada —, mantém vivo o movimento do desejo. Não por ingratidão, mas por reconhecimento de que a completude não habita no ter, mas no continuar a buscar.

 

A estrutura psíquica do humano é sustentada por esta tensão: o que temos, por maior que seja, não anula o que nos falta. E essa falta, longe de ser uma falha, é justamente o que nos move. Freud chamaria isso de Wunsch — o desejo que insiste. Lacan radicalizaria: “o desejo é o desejo do Outro” — e talvez Raquel soubesse disso sem ler nenhum tratado.

 

O nome Yoséf se torna então um mantra existencial: "acrescenta, Senhor". É o eco de uma alma que se recusa à estagnação. Que entende que até mesmo a bênção mais sagrada — um filho — não deve cristalizar o coração num estado passivo, mas renovar nele a chama da busca, da oração, da conexão.

 

No plano psicológico, é um convite a não adormecer após a conquista. É o alerta de que o desejo saudável não é ganância — é movimento vital. Quem para de desejar, morre em vida. Quem acha que já tem tudo, perde o senso do mistério, da surpresa, do sagrado que se revela no “ainda não”.

 

No plano ideológico, Raquel nos ensina uma fé que não se acomoda. Um espiritualismo que não se sacia. Uma forma de estar no mundo que ora agradecendo e ora pedindo — porque sabe que o milagre de hoje não invalida a dependência de amanhã.

 

Yoséf é, portanto, o nome do movimento. Do clamor contínuo. Da oração que reconhece a dádiva, mas não abdica da esperança.

 

E talvez, no fundo, cada um de nós tenha um José dentro da alma: essa parte que, mesmo quando acolhe um milagre, ainda sussurra ao céu…

"acrescenta, Senhor".

 

Jeovan Rangel
Enviado por Jeovan Rangel em 27/06/2025