"O SILENCIO QUE ME ACOLHE"
Há quem diga que a noite é ausência. Mas para mim, ela sempre foi presença — densa, viva, quase íntima. Como se, quando o mundo adormece, algo em mim finalmente acordasse.
Desde pequeno, me lembro de acender a luz não por medo da escuridão, mas para negociar com ela um pouco mais de tempo. A noite me parecia um lugar onde o tempo se expandia, onde os barulhos do dia se calavam e, no eco desse silêncio, eu podia me ouvir.
Alguns chamariam isso de nactofilia. Um nome bonito para o que, no fundo, é um tipo de amor: pela sombra, pelo intervalo, pelo espaço onde o invisível mora. Porque é à noite que as máscaras caem, que a casa respira sozinha, que a alma, enfim, sussurra o que não pôde dizer sob o sol.
Durante o dia, somos todos muito ocupados em sermos alguém. À noite, talvez possamos ser só o que somos — despidos, confusos, poéticos. É ali que meus pensamentos se soltam, que memórias emergem como peixes à superfície, e que meus demônios, quando não me assustam, me ensinam.
A noite, para mim, não é fuga. É retorno. Não é falta — é excesso: de silêncio, de lucidez, de mistério. É quando o mundo finalmente para de gritar, e eu posso escutar o que ficou por dizer.
E talvez seja isso: não sou eu quem escolhe a noite. É a noite que, dia após dia, me escolhe.