“TEM COISAS QUE NÃO DÁ PRA CONSERTAR…”
ETNI, essa frase ecoa no meu peito como um martelo batendo sem parar. E, talvez, seja verdade... Talvez algumas coisas da vida, uma vez quebradas, nunca mais voltem a ser como eram, nunca mais sejam inteiras.
Quando eu te deixei, Etni, você era só um menino... pequeno, inocente, indefeso. E eu... eu era um jovem com vinte quatro anos, perdido, imaturo, sem entender o peso das escolhas que estava fazendo. Abandonei você que acabou sendo criado pelos meus pais. Talvez achando, na minha ignorância, que a vida se ajeitaria de algum jeito.
Mas a vida não se ajeita sozinha. Ela cobra. E cobra caro.
Mesmo ausente, eu tentava... Tentava estar por perto, tentava ser presença onde antes fui ausência. Tentava, de alguma forma torta, compensar o que não se compensa. Eu te dava o que podia, materialmente, e tentava, com meus braços, alcançar um abraço que você nunca me deu por inteiro. E eu não percebia — ou fingia não perceber — que aqueles abraços meio sem jeito, meio de quem queria se proteger, era o grito silencioso de uma dor que eu mesmo plantei em você.
Os anos passaram. E eu insisti. Porque te amo. Porque, apesar de tudo, te amo mais do que qualquer coisa nesse mundo. Te amo de um jeito que eu não sei colocar em palavras, mas que mora aqui, dentro do peito, queimando, sufocando, machucando...
Tentamos conversar algumas vezes. Eu chorei em todas elas. Me despi de qualquer orgulho, de qualquer vaidade, me coloquei na sua frente, nem que fosse só em espírito, e pedi perdão. Não por protocolo. Não por obrigação. Mas do fundo da minha alma. E o perdão não veio.
E você, com os olhos marejados, me disse as frases mais duras que já ouvi, mas, a que mais me marcou foi: “Tem coisas que não dá pra consertar.”
Quando eu disse "eu te amo" várias vezes, você me respondeu: “Você pode dizer quantas vezes quiser, mas eu não sinto. Nunca senti. É sobre isso, pai. Sentir!” E, sim... eu entendi. Entendi que não dá pra apagar as marcas do passado. Que não dá pra enfaixar um coração partido como quem enfaixa um braço quebrado. Senti que, por mais que eu tentasse, não adiantaria mais. Você não queria.
Mas, filho... isso não muda o que eu sinto por você. Eu te amo. Eu te amei desde o primeiro dia. E te amo até hoje. Te amo com todas as forças que habitam este velho corpo, que o tempo já começa a cobrar. E, se a vida me pedisse mil vezes, eu entregaria minha vida pela sua, sem hesitar.
É duro saber que você não consegue sentir isso. É triste perceber que, na sua dor, você repete comigo, sem perceber, o que eu fiz com você. Que agora somos dois homens feridos, cada um no seu canto, olhando pra uma ponte que nunca se construiu.
Hoje eu sigo. Aceito sua decisão. Não vou mais forçar portas que você não quer abrir. Respeito seu silêncio, sua distância, sua dor. Mas carrego comigo a certeza de que, se o amor tivesse som, o mundo inteiro ouviria o quanto eu te amo.
E talvez, quando a vida te colocar de frente com seus próprios arrependimentos — porque ela faz isso com todos nós —, talvez aí você entenda que amar é sempre maior do que qualquer erro, qualquer ausência, qualquer dor. Talvez. Mas, independente disso, onde quer que eu esteja, nesse mundo ou em qualquer outro, sempre haverá em mim uma única verdade imutável: eu serei o seu pai e você me será por filho.
Eu te amo, meu filho. Para sempre.