AMOR NA LÁPIDE
AMOR NA LÁPIDE
Nada mais há nestes teus olhos petríficos;
Desluzidos, não riem, não choram, não dizem nada.
Frutos pecos, caídos à beira da estrada,
Perderam a doçura — necrosados, tornaram-se cítricos.
Não há mais o fulgir lascivo da simples olhadura,
Nascido no átimo da afrenia de um amor ultimado.
Da anteface que antes cobria a tua candura,
Me envolvendo, mesmo distante dos teus braços.
Não há mais o tressuar eflúvio de tua pele,
Nem os sons concordes que sibilam sobre os cravos,
Sob a concertina das notas tristes de uma canção,
Que o agreste estéril fere em meu coração.
Se me cortas, aos poucos, em teus frios agravos,
Sofrimentos da vida são o meu quinhão.
Autor: Jeovan Rangel
Comentário das palavras mais raras
Petríficos → algo endurecido como pedra; aqui, os olhos perderam a vitalidade.
Pecos → frutos malformados, murchos ou ainda verdes; imagem de algo inacabado e sem sabor.
Olhadura → forma antiga/poética de “olhar”, trazendo uma densidade mais clássica.
Afrenia → confusão mental, perturbação; no poema, sugere a loucura apaixonada.
Anteface → aparência, rosto ou máscara que recobre algo; aqui, a “face anterior” da candura da amada.
Tressuar → transpirar, suar levemente; associado ao perfume da pele.
Eflúvio → exalação, perfume ou sopro sutil.
Cravos → pode remeter tanto ao instrumento musical (cravo) quanto à flor; em poesia, a ambiguidade enriquece.
Quinhão → parte, destino ou sorte que cabe a alguém.
Jeovan Rangel
Enviado por Jeovan Rangel em 13/06/2020
Alterado em 20/08/2025